Procuro o leão no quarto deserto,
Perdido que estou na fertilidade da imaginação
Que me pergunta pelo medo que tinha,
Olho à minha volta e deleito-me
Com o silêncio desta doce melancolia
Que sobrevive aos apelos do êxtase.
E o leão não aparece, e o medo foi rasgado,
Mastigado e engolido pelo último,
Extinguiu-se, já não o encontro.
Que faço eu aqui se perdi o grito do medo
Que me protegia dos fantasmas que empalidecem
A pele e tornam a coluna vertebral numa curvatura de cifose.
Assim sendo faço mais um furo no cinto
Que me segura as calças tão usadas
Que perderam o azul,
Enquanto esperam pelo balde do lixo,
Para depois serem trocadas por outras.
Prefiro as calças usadas e dou-lhes mais algum uso,
E dou-me mais uma oportunidade
De me agarrar a alguma coisa,
Porque o desejo de ser ninguém foi abalado
Pela certeza da terra
Que será a minha última e derradeira
Morada.
Resta-me a tristeza do ferro velho,
A alegria do amor que me mastiga,
A esperança dos meus doentes,
A empatia para conhecer outros deuses, os meus amigos,
Familiares,
Poetas mortos,
Poetas vivos sem expetativas
Da cor das palavras
Em que naufragam
Os seus sentimentos,
Os seus olhos, ouvidos, e máquinas de escrever vintage
Entre outras raízes que penetram o solo,
Desta amargura
Tremendamente
Passageira que significa, nem mais nem menos
Do que um intervalo de mim,
O intervalo que eu rejeito,
Porque se perde na falta de raça
Que prefiro bem longe da minha fome de isenção impossível.
Irreversível.
Filipe Cunha,
16 de Abril de 2013,
Vila Nova de Gaia
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